Blog do Lawrence | A Desova das Tartarugas

Chegando a pequena Tapaúa, fomos comprar mantimentos para passar uma semana na Reserva Abufari. Após açougue, padaria e mercado, carregamos a voadeira e iniciamos nossa navegação pelo Rio Purus.

Após uma hora e 45 minutos, avisto a placa que marca a divisa da Reserva. Mais um pouco de navegação e uma boca de rio encontra o Purus.

Agenor, funcionário do ICMBio que me guia, explica melhor o que é o Rio Abufari. No momento em que chegamos, o encontro dos dois rios fervilhava de vida… literalmente!

Um cardume estava passando e botos, tucuxis e jacarés-açu o predavam ao mesmo tempo. Pirarucus “boiavam” para respirar, pirararas nadavam no raso e uma ou outra tartaruga emergia no meio da balbúrdia.

Fiquei em estado êxtase. Viajo pela Amazônia desde 1992, já estive em muitas partes dela, mas jamais havia visto algo parecido com o que estava presenciando.

Nos acomodamos na base e fomos conhecer a praia onde as tartarugas desovam. Esses locais são chamados de “tabuleiro”.

As tartarugas macho nascem na praia, entram na água e nunca mais na vida pisam em terra. As fêmeas só o fazem na época de desova.

O processo se inicia com subidas na praia para “assoalhamento”. Esse é o nome do processo de “tomar sol” por algumas horas por dia, para que os ovos “amadureçam” dentro da tartaruga e estejam prontos para a desova. Nessas subidas a tartaruga também “inspeciona” o tabuleiro.

Como são muito caçadas, as Tartarugas da Amazônia são muito ariscas a presença humana. Eu, o cinegrafista Evandro Fontana e o fiscal Agenor, temos de parar o barco a mais de 400 metros do local e nos aproximar caminhando silenciosamente pelo mato, por trás da praia.

A tarefa já seria suficientemente complicada devido ao peso do equipamento… e fica ainda mais pelo solo enlameado. Com esforço, chegamos a um local onde observamos cerca de 150 tartarugas tomando banho de sol.

O gráfico com a data das desovas nos últimos anos indica que o processo costuma acontecer na primeira semana de setembro. Chegamos a Abufari no dia 11, quando a desova deveria estar no ápice, mas nem começou. A expectativa é grande e a qualquer momento pode iniciar.

No dia seguinte, chegamos ao tabuleiro antes do sol nascer e colocamos uma barraca da qual eu filmaria as tartarugas. A idéia é que elas fossem se acostumando a forma da barraca, para que eu pudesse filma-las mais de perto.

A barraca deu certo, mas uma tempestade caiu e acabou alagando ela. Salvei os equipamentos porque sempre ando com sacos estanques… o clima está mesmo louco. Setembro é o pico da temporada seca na Amazônia!

Justamente essas chuvas fora de época explicam o atraso para a desova. Instintivamente as tartarugas percebem no assoalhamento que a consistência da areia não esta ideal pra desova.

Como elas sabem isso? Bem, quelônios estão no planeta há 220 milhões de anos, antes dos tiranossauros…

Nossa previsão inicial era de passar 4 a 5 dias na reserva. Mas o atraso causado pelas chuvas foi nos atrasando, atrasando… Na natureza aprendemos que a dimensão de tempo é outra.

Toda manhã repetíamos o procedimento de acordar antes do sol nascer e nos posicionar a espera das tartarugas.

Depois de adiar nossa volta duas vezes, e com uma estadia de quase 10 dias além do previsto, finalmente as tartarugas desovaram e tivemos a “sorte” de filmá-las..

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